A poluição por plásticos é hoje um dos problemas ambientais mais urgentes, já que o rápido aumento da produção desse tipo de produto supera a capacidade do mundo de lidar com ele. Além disso, não podemos esquecer que os resíduos plásticos já chegaram aos oceanos, contaminando a água e prejudicando a vida marinha.
Agora, nessa temática, uma nova pesquisa, divulgada na revista Science of The Total Environment, apontou que 78,5% de todo o lixo plástico encontrado em várias praias do Ceará, no Nordeste do Brasil, veio da África. Veja abaixo mais detalhes do estudo.
O estudo inédito foi coordenado pelo 'Projeto Detetive do Plástico', do Instituto de Ciências do Mar (Labomar) da Universidade Federal do Ceará (UFC), com parceria de outras instituições.
O trabalho consistiu em duas etapas: a primeira, identificar a origem geográfica do lixo. Para isso, os pesquisadores analisaram as marcas das embalagens plásticas encontradas nas praias. Eles fizeram uma “auditoria de marcas” usando o Google Lens para identificar logotipos e símbolos presentes nas embalagens.
Foram coletados 1.062 resíduos plásticos no final de 2022 nas praias do Futuro, de Jericoacoara e de Porto das Dunas, todas no estado do Ceará. Desses resíduos, 591 continham marcas, com 464 (78,5%) sendo de origem africana e pertencendo a 31 empresas da-mãe África.
Na segunda etapa, foi utilizado um modelo de dispersão que simula a trajetória dos plásticos, de acordo com a intensidade e direção das correntes marinhas do oceano Atlântico Sul. Durante um ano, o percurso foi monitorado. Aqui, a possibilidade do transporte da África até a costa brasileira foi confirmada.
Da quantidade de lixos plásticos encontrados no Ceará, 78,5% vieram da África, e destes, 90,2% é de origem da República Democrática do Congo. Apenas 15,7% dos resíduos plásticos encontrados eram de origem brasileira, e 5,8% vieram de outros países, incluindo a Índia, Emirados Árabes Unidos, China, Itália e Alemanha. E ainda segundo a pesquisa, é possível que o impacto da poluição plástica chegue até ao sul do Brasil e também a outros países.
Entre as marcas encontradas, 15 pertenciam à indústria de bebidas e outras 15 à indústria de cosméticos. As tampinhas de garrafas de refrigerante, suco e água representam 79,8% de todos os resíduos das marcas africanas. Três marcas do Congo foram responsáveis por 57,9% de todo o lixo encontrado: Festa Cola, que é um refrigerante (36,7%); Zest, um suco de manga (13,8%); e Swissta, uma marca de água mineral (7,4%).
O lixo é trazido pelas correntes marítimas do oceano Atlântico Sul ao longo de mais 5.600 quilômetros de distância, que transportam os plásticos em um percurso de cerca de 5 a 6 meses, desde a foz do Rio Congo até a costa do Ceará. Esse fenômeno ocorre regularmente, principalmente no segundo semestre do ano, quando a ação dos ventos é mais forte, ajudando a empurrar os plásticos em direção às praias.
As simulações mostraram ainda que um volume maior de lixo chegou depois de 10 a 11 meses.
A conclusão é que a maior parte dos resíduos da África permanecia no próprio Atlântico Sul oriental e central. Mas, mesmo a menor quantidade dele que alcançava o Brasil já foi suficiente para gerar uma poluição relevante nas nossas praias nordestinas.
Referência da notícia:
Brabo, L. et al. A transcontinental threat: Plastic waste from Africa invades Brazil's coast. Science of The Total Environment, v. 954, 2024.